sábado, 18 de janeiro de 2014

Primeira vez em uma ambulância e conhecendo a cidade de Valença

Nos primeiros segundos do ano de 2014, nos estávamos, eu Marcelo e Victor, na pista Mainstage curtindo a maior sonzeira. Porém cerca de 20 minutos após a virada, meu irmão começou a se sentir mal novamente. Talvez já tivesse passado o efeito dos remédios e o problema (que não tínhamos ideia do que era) tivesse voltado.

Sem pensar duas vezes fui com ele para a barraca. Não ia conseguir deixar ele sozinho lá. Então nos despedimos de Marcelo e fomos para nossa barraca. Chegamos e dormimos.
No dia seguinte, acordamos cedo como de costume, o sol não deixa ninguém dormir.  Logo perguntei a meu irmão se ele estava bem. Ele disse que estava mais ou menos. Fui ver se ele estava com febre. Mal coloquei a mão sobre seu rosto, já senti o calor. Ele não estava com febre. Ele estava queimando de febre.
Fomos na hora para o pronto-atendimento do festival. No caminho, topamos com nossos colegas de Curitiba. Luiza estava também indo para a enfermaria com indisposição e enjoos. Seguimos em grupo para lá. Seu namorado a acompanhava e eu acompanhava meu irmão.
Chegando lá meu irmão esperou e estava cada vez mais mole, digamos assim, sem disposição e força. Tentei já chamar a enfermeira pois ele já tinha feito seu cadastro no dia anterior. Quando a enfermeira pegou nele e mediu a temperatura, já deu um jeito de colocar ele para dentro. Ele estava com 40º de febre. Pegamos uma bacia com gelo e tiramos a camisa dele. Molhamos a mesma e a colocamos em corpo para diminuir a temperatura.
Na enfermaria diversas pessoas estavam sendo atendidas. A maioria com os mesmos sintomas, enjoo, cansaço e diarreia. O calor da Bahia deixava as pessoas muito indispostas sem contar água do mangue deixaram diversas pessoas com pequenos se sentindo mal.
Aos poucos a temperatura de meu irmão foi baixando para 38º. O medico veio o examinar e constatou que poderia ser dengue. Para ter certeza era necessário irmos até um laboratório fazer um exame para avaliar o nível de plaquetas no sangue.
O porém era que, como estávamos no primeiro dia do ano, a cidade de Ituberá, que era a mais próxima, estavam em um “feriado”. Tudo estava fechado, inclusive o laboratório. Sobrava então a cidade de Valença, que ficava a 100 km do festival.
O médico disse que iriamos assim que outra ocorrência aparecesse para não irmos com a ambulância quase vazia. E depois voltaríamos com a ambulância. Melhor assim pois estávamos com pouco dinheiro, com uma pessoa fraca e não conhecíamos muito bem a região.
Ficamos esperando até meio dia. Na fila para ir até a cidade, tínhamos nós e mais Clara, uma simpática espanhola, que supostamente estaria com a costela fraturada.
Como mais ninguém apareceu fomos nós.
Nenhum de nós nunca tinha andado de ambulância. Fomos observando tudo e conversando pelo caminho. Clara, já tinha morado em diversos países. Agora morava na Chapada Diamantina, na Bahia mesmo.
Chegando em Valença, logo fomos para a Santa Casa de Valença. Logo fomos atendidos. Clara fez seu raio-X. Nenhuma costela quebrada, ainda bem. Victor logo foi para o soro. Enquanto isso, ficamos lá fora esperando.
O motorista da ambulância veio com a companhia de uma outra funcionária do festival. Ambos queriam conversar bastante e conhecer mais sobre aqueles malucos que frequentavam o Universo Paralello. Era todo tipo de perguntas.
-Menina, como vocês ficam ouvindo música eletrônica o dia todo?-perguntou indignada - Eu curto mesmo é escutar um arrocha!
Diferenças a parte, conversamos muito e demos muita risada. Eles nos contaram diversas histórias que virão naqueles dias, e nós contamos como era a tribo do lado de lá.
Depois de algum tempo, retornei para a sala que meu irmão estava pra saber noticias dele. A coleta do sangue já fora feita, mas o resultado iria demorar 4 horas para voltar e dai podermos ter certeza da existência de dengue.
Quando retornei para dar a notícia aos meus companheiros, tive a surpresa:
-Menina, 4 horas é muito tempo. O festival não permite ficar fora tanto tempo. Vamos ter que voltar- disse o motorista.
-Mas e dai como ficamos? Se meu irmão estiver mal para voltarmos? Nossas coisas estão todas lá- perguntei meio desesperada.
-Bom, o máximo que posso fazer é tentar retornar aqui umas 19hrs, mas pra ser sincero, acho difícil.
Bom, ele tinha que seguir as ordens do festival, nada que eu argumentasse iria fazer ele esperar. Eles, então se foram.  Sentei no meio fio e comecei a bolar um plano.
Pedi informação a um morador e ele me indicou a rodoviárias. Fui até o local procurar informações.
A cidade de Valença estava vazia e silenciosa. As ruas eram simples e com construções antigas, muito elegantes. Alguns senhores estavam nas ruas bebendo cerveja e dando risada.
Na rodoviária diversos mochileiros indo e voltando do Moro São Paulo, ilha que tem uma beleza e historia conhecidas em todo o Brasil e recebe muitos turistas. Por Valença consegue-se chegar na ilha. Fui ao guichê que vendia passagem para Ituberá. O último ônibus era as 19:50. O tempo ia dar certinho para irmos embora.
Retornei ao hospital. O porteiro, ao invés de ficar zangado pelo um entra-e-sai do hospital, ficava preocupado e tentava me ajudar. Viva a simpatia!
Meu irmão continuava no soro, esperando o resultado dos exames. Informei as boas novas e fiquei ali com ele a esperar. Nesse meio tempo, de tudo vimos. A moça que chega desmaiada, a criança que vai fazer inalação e chora. O maluco que apanhou, sabe se lá de quem, e cospe sangue.
Uma movimentação ocorre e da porta vem o pai gritando
-Salvem meu filho!- dizia ele com a criança afogada em seus braços.
Infelizmente a criança já estava morta. Os gritos do pai ecoavam em nossas mentes como marteladas. Que tristeza ver aquelas cenas.
Logo mais a morte se confunde com a vida quando uma mãe chega para dar a luz. Que ironia! A cada cena desse passo, nos olhávamos, eu e meu irmão, com olhar de gratidão, pois por mais mal que estivéssemos estávamos vivos.
O primeiro dia do ano, que inspira felicidade e boas vibrações foi passado num hospital público de uma cidade na Bahia. Uma lição para se levar. Precisamos agradecer mais e reclamar menos.

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